quarta-feira, novembro 09, 2005

Carta do GAT ao Ministro da Saúde acerca do acesso à saúde dos imigrantes irregulares

Ex.mo Senhor
Ministro da Saúde
Professor António Correia de Campos
Avenida João Crisóstomo, 9 – 7º
1049-062 Lisboa

Lisboa, 4 de Novembro de 2005.

Assunto: A violação sistemática do Despacho n.º 25.360/2001 de 16 de Novembro de 2001, da responsabilidade do Ministro da Saúde, António Correia de Campos, na parte que garante o acesso à saúde dos imigrantes irregulares, por parte de todos ao actores que intervêm no processo: Juntas de Freguesia, Centros de Saúde e Hospitais Públicos.

Proposta: Reunião conjunta com os responsáveis da área do VIH/SIDA e imigrantes

Ex.mo Professor,

O G.A.T.- Grupo Português de Activistas sobre Tratamentos de VIH/SIDA-Pedro Santos é uma organização não governamental, constituída por pessoas infectadas e afectadas pelo VIH/SIDA, que defende que o controlo da epidemia passa necessariamente pelo acesso universal das pessoas infectadas aos cuidados de saúde e tratamentos. O G.A.T. tem como missão política principal pressionar os poderes públicos no sentido de garantir disposições legais, políticas e programas que garantam as melhores práticas no acesso e adesão das pessoas aos tratamentos e monitorização da execução efectiva de tais medidas. Os utilizadores de drogas e os imigrantes em situação irregular (muitas vezes envolvidos em actividades de sexo comercial) são grupos que, seja pela dimensão, seja pela vulnerabilidade à infecção, nos merecem a maior atenção.

O G.A.T. considera a lei existente um excelente exemplo de respeito dos direitos humanos, defesa da saúde pública, com uma visão baseada na realidade e evidência científica e em critérios económicos, mas não economicistas, sobretudo na garantia de cuidados de saúde gratuitos para as doenças transmissíveis, para a saúde materna, infantil e planeamento familiar para imigrantes irregulares.

O problema é a não implementação generalizada da lei por todos os intervenientes. Não só, aparentemente, todo o pessoal dos serviços de saúde (dos médicos aos administrativos) não a conhece, como quando confrontados com a lei, continuam a não a respeitar, quando, do nosso ponto de vista, deviam ser os agentes activos da divulgação dos direitos dos doentes envolvidos.

Esta postura nos serviços de saúde mantém-se desde a publicação do Despacho e mesmo depois da Circular Informativa da Direcção-Geral de Saúde de 2 de Abril de 2002, da responsabilidade do Director-Geral e Alto Comissário da Saúde, Professor Pereira Miguel, que foi dirigida a todo o pessoal dos estabelecimentos de saúde do SNS e é muito clara.

Nas Juntas de Freguesia, a recusa em emitir o documento comprovativo de residência é também generalizada, apesar do disposto no Art.º 34º do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de Abril que citamos:
Artigo 34.º Atestados emitidos pelas juntas de freguesia
1 - Os atestados de residência, vida e situação económica dos cidadãos, bem como os termos de identidade e justificação administrativa, passados pelas juntas de freguesia, nos termos das alíneas f) e q) do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, devem ser emitidos desde que qualquer dos membros do respectivo executivo ou da assembleia de freguesia tenha conhecimento directo dos factos a atestar, ou quando a sua prova seja feita por testemunho oral ou escrito de dois cidadãos eleitores recenseados na freguesia ou, ainda, mediante declaração do próprio.
2 - Nos casos de urgência, o presidente da junta de freguesia pode passar os atestados a que se refere este diploma, independentemente de prévia deliberação da junta.
3 - Não está sujeita a forma especial a produção de qualquer das provas referidas, devendo, quando orais, ser reduzidas a escrito pelo funcionário que as receber e confirmadas mediante assinatura de quem as apresentar
.”

De referir ainda que estes direitos foram já objecto de duas publicações de divulgação dos direitos aos cuidados de saúde para imigrantes, uma da responsabilidade da Associação Abraço, outra do Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas e disponível no site da Coordenação Nacional da Infecção VIH/sida, sem que a situação se tenha alterado.

O G.A.T. pretende que sejam tomadas as medidas necessárias, pelo Senhor Ministro da Saúde, ou por quem receber a sua delegação, para que sejam assegurados os direitos legais à saúde dos imigrantes regulares e irregulares. Pretende também ser informado dessas medidas e sugere que as associações na área do VIH/sida e de migrantes sejam também incluídas nesse processo.

O G.A.T. está disponível para contribuir activamente na discussão, aprovação e avaliação dessas medidas, como recomendado na Declaração de Compromisso da UNGASS para a epidemia de VIH/sida, no que respeita ao envolvimento das organizações das pessoas que vivem com VIH/sida, Declaração subscrita pelo Estado Português, (lembramos que neste momento decorre o processo de avaliação da implementação da Declaração nos países subscritores).

O caso concreto (em anexo), mas que é um de centenas nestes últimos anos, configura um desrespeito grave dos direitos deste cidadão. A situação não está ainda completamente resolvida e, como qualquer especialista independente nesta área pode confirmar, pôs em risco a vida desta pessoa e pode ter-lhe causado danos irreversíveis. Por isso pedimos também o apoio e o parecer da Entidade Reguladora da Saúde e da Provedoria de Justiça.

Estamos confiantes que as nossas razões são também as razões de Vossas Excelências e que passos concretos serão dados para começar a alterar esta intolerável situação e, para tal, sugerimos o envolvimento da Direcção-Geral da Saúde, do Alto Comissariado da Saúde, da Coordenação Nacional da Infecção VIH/sida, do Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas e do Ministério da Administração Interna para resolver o bloqueio existente nas Juntas de Freguesia. Damos também conhecimento ao Senhor Presidente da República que com a sua magistratura de influência e atenção constante a estes problemas tantas vezes tem contribuído para os resolver.

O G.A.T. propõe-se constituir, se necessário, um grupo de juristas, em regime voluntário, para apoiar pessoas em situação semelhante e responsabilizar civil e criminalmente os responsáveis individuais e colectivos pelo desrespeito dos direitos legais que lhes assistem na doença.

Agradecendo a atenção dispensada e colocando-nos à disposição para esclarecimentos, sem mais, subscrevemo-nos,
Com os nossos melhores cumprimentos,
A direcção do GAT

Comments:
Resposta do Provedor de Justiça: http://gatportugal.blogspot.com/2005/11/provedor-de-justi-abre-instruo-depois.html
 
Enviar um comentário

<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?

Enter your email address below to subscribe to Blog do GAT!


powered by Bloglet