segunda-feira, janeiro 09, 2006

Tribunal recusa indemnização a homem infectado no Hospital de Santo António



Público 05.01.06

O Supremo Tribunal Administrativo recusou o pagamento de uma indemnização a um homem que contraiu o vírus HIV2 durante uma transfusão de sangue, em 1986, no Hospital de Santo António, no Porto, avança a edição de hoje do "Diário de Notícias".

De acordo com o DN, num acórdão de 14 de Dezembro passado, os juízes admitem que, entre 1975 e 1987, o Hospital de Santo António recebeu sangue de um dador infectado com o HIV2. O vírus HIV2 e HIV1 (vírus da imunodeficiência humana) estão na origem da sida (síndroma da imunodeficiência adquirida) e pertencem à mesma família, apesar de serem diferentes geneticamente.

Os juízes do Supremo consideraram, no entanto, que naqueles anos a despistagem do vírus ainda não era possível e que as transfusões de sangue não são uma actividade "excepcionalmente perigosa". O caso remonta a 1986, quando Joaquim Conceição, nascido em 1942, recorreu ao Hospital de Santo António para uma intervenção cirúrgica em ortopedia, em consequência de vários trabalhos na marinha mercante, e que implicou uma transfusão de sangue.

Em 1990, Joaquim Conceição foi diagnosticado como portador do vírus HIV2 e a explicação para o facto viria a ser conhecida quatro anos mais tarde. Segundo o jornal, os responsáveis hospitalares admitiram que, durante 12 anos - entre 1975 e 1987 -, tiveram um dador de sangue portador daquele vírus, que foi identificado apenas em 1987, quando a despistagem começou a ser possível.

Em 1994, Joaquim Conceição (que morreu em 2001) resolveu, juntamente com a companheira, intentar uma acção contra o hospital e contra o Estado, com vista à condenação destes ao pagamento de uma indemnização. Os acusados consideraram o caso prescrito e o Estado - representado pelo Ministério Público - alegou ser parte ilegítima, desviando as responsabilidades para o hospital.

A questão chegou ao Supremo Tribunal Administrativo (STA) que, em 2000, deu razão ao Estado, considerando que este nada tinha a ver com o assunto, sem admitir, no entanto, a prescrição do processo. O caso foi então julgado no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em 2004, tendo como réu apenas o hospital. O juiz do TAF conclui que não houve qualquer acto ilícito ou culposo por parte dos técnicos de saúde, salientando que só a partir de 1987 foi possível despistar o HIV2. O hospital foi absolvido. Mas o advogado de Joaquim Conceição, Lázaro Ferreira, recorreu da decisão para o STA, que, a 14 de Dezembro último, confirmou a sentença anterior. O advogado considerou esta decisão "indigna de um Estado de direito".

Lázaro Ferreira disse ao DN que ficou "incrédulo" e acrescentou que "desde o início dos anos 80 que vários países europeus, como a França, a Inglaterra ou Alemanha, se disponibilizaram para indemnizar todos os contaminados por transfusões sanguíneas". De acordo com o DN, o Supremo Tribunal Administrativo decidiu de modo oposto numa outra sentença, em Março de 2005, estabelecendo a perigosidade das transfusões de sangue e condenando o Hospital de Cascais a indemnizar uma paciente infectada com HIV1. No caso desta paciente a transfusão foi feita em 1994, numa altura em que já se fazia a despistagem.

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