sexta-feira, dezembro 01, 2006

As dez metas do Plano anterior

Público 01.12.06

META 1
Criar um sistema de obtenção permanente de dados que permita a monitorização da epidemia através de indicadores epidemiológicos, mais próximos da realidade

"Não se vêem resultados" da declaração obrigatória

O regime de declaração obrigatória foi alargado ao vírus da imunodeficiência humana/sida há cerca de ano e meio, à semelhança do que já acontecia com doenças como o sarampo ou a sífilis. Pretendia-se que a medida reduzisse o elevado grau de subnotificação de casos em Portugal. Segundo estimativas das Nações Unidas, poderão existir no país 32 mil pessoas infectadas; menos de metade estão declaradas.

O Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (Insa), que recebe estes dados, diz que é ainda cedo para fazer avaliações sobre o sucesso da medida. Já o coordenador nacional para a Infecção HIV/sida, Henrique de Barros, é taxativo: "Um ano depois não se vêem resultados. O problema da notificação não se resolve com cosmética" - lembra que a falta de notificação, apesar de teoricamente ser obrigatória, não implica qualquer penalização. "O único canal [de notificação] são os clínicos. Um dos erros básicos que fazem é assumir que alguém já notificou antes deles."

Henrique Barros diz que está agora a ser criada uma aplicação informática de gestão, para centralizar informações vindas também de laboratórios, centros de saúde, hospitais, desenvolvida pelo Instituto de Engenharia e Sistemas e Computadores do Porto, para estar operacional em meados de 2007.

META 2
Aumentar em 30 por cento indivíduos que conhecem os métodos correctos de prevenção da infecção pelo HIV, assim com o seu estado serológico para o HIV

Muitos continuam a pensar que picada de insecto transmite sida

Cada vez mais portugueses parecem conhecer os métodos correctos de prevenção do HIV. A comissão de luta contra a sida encomendou dois estudos sobre as percepções de risco, um em 2004 e outro em 2006. E embora as metodologias sejam diferentes e os resultados não possam ser directamente comparados, parece haver progressos.

No inquérito realizado este ano pela Marktest, 97 por cento dos inquiridos apontavam a relação sexual desprotegida como uma das principais vias de contágio; no estudo sociológico de 2004 eram apenas 53 por cento. Já as ideias erradas permanecem.

Em 2004, um quinto (21 por cento) dos inquiridos dizia que a picada de insecto podia transmitir sida; o inquérito deste ano revelou que 30 por cento tinham a mesma opinião.

Em 2004, 37 por cento acreditavam que a doença podia apanhar-se em sanitários públicos, agora este valor é de 30 por cento. Este ano, só 27 por cento dos portugueses dizem ter feito o teste da sida, pouco mais do que em 2004, quando eram 24 por cento.

Na opinião de Henrique Barros, "as pessoas já têm conhecimentos correctos, é preciso é expurgar conhecimentos errados". E mais importante do que agir sobre os conhecimentos "é agir sobre a mudança de comportamentos", que não estão a acompanhar o facto de as pessoas terem informação correcta. "Aumentar em 30 por cento os conhecimentos correctos não faz sentido."

META 3
Reduzir a transmissão do HIV/sida da mãe grávida para o bebé para valores iguais ou inferiores a dois por cento

Valores de transmissão parecem estar a descer

Se uma grávida infectada com HIV/sida tomar medicamentos anti-retrovirais nos últimos meses de gestação, não amamentar o bebé e se à criança for dada medicação, a transmissão é travada. O método é fácil, já é mais difícil saber se a meta de redução de transmissão até valores de dois por cento foi atingida. Os dados recolhidos pelo Insa revelam "sucesso" nesta área: em 2004 estava-se nos 3,1 por cento, em 2005 nos 0,4 e em 2006 nos 2,3.

"Não é um retrato rigoroso, mas é muito próximo", afirma Elizabeth Pádua, investigadora auxiliar no Laboratório de Referência da Sida do Insa. Os casos são contabilizados numa amostra anual de cerca de 250 análises sanguíneas aos cordões umbilicais de bebés. E não incluem a região Norte.

Cristina Guerreiro, obstetra da Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, duvida que os números do Insa sejam um retrato representativo do país. Membro do Grupo de Trabalho da Transmissão Vertical, que junta pediatras e obstetras de todo o país, nota que "em 2005 o Insa teve 228 amostras, o que não é nada, são fragmentos da realidade nacional e não podem ser extrapolados". O grupo de que faz parte recolhe dados de hospitais que representam 70 por cento dos partos realizados no país. Não têm ainda os números de 2005 e 2006, mas os de 2004 colocam as taxas de transmissão acima das do Insa: 3,6 por cento em vez de 3,1 por cento. O grande problema são as grávidas que chegam ao parto sem saber que estão infectadas. A obstetra lembra que um inquérito recente revelou que nem todos os serviços de obstetrícia têm testes rápidos para lhe fazer. "É um mau indicador."

META 4
Manter a garantia de acesso a todos os utentes do Serviço Nacional de Saúde infectados pelo HIV/sida aos cuidados de saúde mais adequados

Primeira consulta depois do diagnóstico pode levar "dois a três meses"

O tempo entre o momento em que a pessoa sabe está infectada e a primeira consulta num serviço hospitalar de doenças infecto-contagiosas pode ser "de dois a três meses". A situação é denunciada por Pedro Silvério Marques, membro do conselho consultivo do Grupo Português de Activistas de Tratamento para o HIV/sida. Ao mesmo tempo, diz, "há sérias limitações no acesso às terapêuticas mais indicadas e medicamentos mais recentes".

Henrique de Barros reconhece que existem barreiras de acesso às primeiras consultas. Idealmente, ninguém deveria estar mais de sete dias, depois do diagnóstico positivo, sem seguimento hospitalar. "Nos centros de atendimento a toxicodependentes há pessoas que estão meses à espera de consulta", reconhece, sendo que 10 por cento dos 30 mil consumidores de droga estão infectados. A grande prioridade vai ser dada a este grupo.

META 5
Dispor de uma equipa multidisciplinar na área do HIV e Infecções Sexualmente Transmissíveis em 70 por cento dos centros de saúde

"Não há logística de pessoas para criar equipas específicas"

A meta não só não foi alcançada como "nem era desejável que assim fosse", defende o coordenador nacional Henrique Barros. "Não há logística de pessoas para ser possível criar equipas específicas nos centros de saúde." Em seu entender, a aposta deve ir para a criação de condições que permitam aos médicos de família referenciar com rapidez o doente para uma consulta hospitalar da especialidade.

META 6
Estruturar e implementar centros de terapêutica combinada

Alguns hospitais têm-nos "para alguns doentes"

Estes centros de terapêutica combinada pretendiam dar a populações toxicodependentes infectadas o "três em um", tendo num mesmo local administração de medicamentos para a infecção, para a tuberculose e tratamentos de substituição de consumo de opiáceos com metadona. Henrique Barros afirma que "alguns hospitais têm para alguns doentes centros de terapêutica combinada, mas não existe nada de estruturado. É uma das áreas em que é preciso apostar".

META 7
Contribuir para a existência de políticas concretas e conjuntas de combate à co-infecção tuberculose-sida

Metade dos doentes com tuberculose não é testada para HIV

A meta continua actual e por atingir. Quase metade dos casos de HIV/sida em Portugal são identificados perante o diagnóstico da tuberculose. Só 43 por cento das pessoas com a doença pulmonar são diagnosticadas para o HIV/sida, lamenta o coordenador nacional, Henrique Barros, que também dirige o grupo de trabalho que está a elaborar o novo Programa Nacional de Luta contra a Tuberculose, igualmente atrasado.

META 8
Contribuir para a existência de programas-piloto de rastreio, acção clínica a prevenção sobre HIV/sida, tuberculose e infecções sexualmente transmissíveis, em meio prisional, sob a coordenação da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais

Troca de seringas foirecomendada há três anos e aprovada ontem

Não é feita "distribuição sistemática de preservativos aos reclusos entrados no sistema", constataram este ano os peritos que elaboraram o Plano de Acção Nacional para o Combate à Propagação de Doenças Infecciosas em Meio Prisional, que foi ontem aprovado na Assembleia da República. Uma das medidas mais emblemáticas deste plano - a troca de seringas nas cadeias - já há muito foi recomendada.

Um outro relatório de uma outra comissão - de estudo e debate das reformas do sistema prisional -, nomeada há três anos e presidida por Diogo Freitas do Amaral, sugeriu em Fevereiro de 2004 exactamente o mesmo. Nada avançou. A nova comissão quer agora a troca de seringas em fase experimental em duas cadeias (o relatório inicial previa quatro). Data prevista: 2007.

A directora-geral dos serviços de saúde da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, Graça Poças, afirma que a partir de meados de 2005 o rastreio de doenças infecciosas passou a ser feito a todos os reclusos. No plano era também prevista a criação de centros de terapêutica combinada - em que se junta a toma de medicamentos contra a infecção, a tuberculose e a administração de metadona. A responsável afirma que existem em metade das cadeias. Os dados de infecção nas prisões apontam para quatro por cento de reclusos infectados com HIV; este número sobe para cinco por cento quando se fala de HIV e hepatites.

META 9
Integrar progressivamente as respostas sociais apoiadas financeiramente pela CNLS na rede de cuidados continuados do Ministério da Saúde

Comissão para conhecer doentes dependentes ainda vai ser nomeada

A integração de casos sociais de doentes com sida na rede de cuidados continuados - destinada a dar soluções a pessoas em situação de dependência - está longe de ter ocorrido. Até porque a criação da própria rede de continuados vai demorar dez anos a montar, explica a coordenadora nacional para a Saúde das Pessoas Idosas e Cidadãos em Situação de Dependência, Inês Guerreiro.

Está-se agora na fase de nomeação dos membros de uma comissão técnica para avaliar quantos são os casos de doentes com HIV/sida, com dificuldades de subsistência, sem local para viver e sem suporte familiar que precisam de um local que os acolha. Reconhece-se que existe "uma pequena minoria" nestas condições - sem-abrigo, toxicodependentes e idosos -, explica a coordenadora. Inês Guerreiro acredita que bastará uma instituição de acolhimento para o país inteiro, com cuidados de enfermagem, que talvez possa estar operacional no próximo ano.

META 10
Contribuir para a existência de legislação que proteja os direitos pessoais, sociais e económicos da pessoa infectada pelo HIV

Acesso à habitação continua a ser dificultado

Para fazer um empréstimo bancário é preciso ter um seguro de vida. Para os doentes infectados com HIV/sida esta continua a ser uma missão quase impossível, o que lhes veda muitas vezes o acesso à habitação, reconhece o coordenador nacional, Henrique Barros. O último texto legislativo aprovado nesta área é deste ano e pretende proteger "os doentes com risco agravado de saúde" de discriminações deste tipo (Lei n.º 46, de Agosto deste ano).

Outras das medidas da comissão na área da protecção dos direitos dos doentes, em Abril de 2005, foi a criação da Plataforma Laboral contra a Sida, que une sindicatos e entidades patronais. Uma das suas funções seria receber denúncias e queixas de discriminação no local de trabalho. Até agora a plataforma não recebeu qualquer queixa.

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